segunda-feira, dezembro 11, 2006

MATEIRA: REVISTA CARTA CAPITAL

Amigos, recebi um e-mail do amigo Roberto Walter (Funcionário da ANCINE) que gostaria de compartilhar com vocês. Agradeço desde já a generosidade do Amigo Roberto.


SEGUE A MATÉRIA

CINEMA, SÓ EM DVD

Nas pequenas cidades e periferias, tela grande é um negócio raro.
E à beira da falência. A torrente de meias-entradas é vilã unânime do lado de fora das telas. Mas, entre os donos dos pequenos cinemas, a lista dos problemas e entraves ao negócio inclui fatores que os grandes centros desconhecem. "É engraçado. Todo mundo " fala que tem de ter mais cinema no Brasil, mas a gente não consegue deixar abertos os que já existem:' É assim que Eli Jorge, dono de 36 salas espalhadas pelo País, nos ciceroneia por esse universo quase anônimo, que encolhe em silêncio.
É lugar-comum, nas discussões sobre cinema no Brasil, a constatação de que o mercado só crescerá se for ampliado o circuito exibidor. A proporção do número de telas por habitante é, realmente, uma das menores do mundo. Aqui existe uma sala para cada 93 mil pessoas. Nos EUA, são 7,7 mil; na França, 11 mil; no México, 32 mil; na vizinha Argentina, há uma sala para cada 37 mil habitantes.
O relato de Eli Jorge, que é também presidente do Sindicato dos Pequenos e Médios Exibidores, ilustra as razões de tal estatística. E torna visíveis as feições desse mercado hoje dominado pelos grandes grupos, como Cinemark, Severiano Ribeiro e UCI. Nascido em Bezerros, cidade a 95 quilômetros do Recife, Jorge define-se por comparação: "Vim de pau-de-arara, comecei como bilheteiro e fui indo, indo... Minha história é quase igual à do Lula".
Em São Paulo, pisou pela primeira vez num cinema aos 17 anos, como faxineiro do Cine Cairo, na região central da cidade, onde tinha lugar a produção da chamada Boca do Lixo. "Isso aqui era o centro da cinematografia naquela época.
"Eu sempre fui prestativo, então fui crescendo", conta. De faxineiro, passou a "porteiro indicador" (indicador, para quem não sabe, é o velho lanterninha), gerente e, por fim, representante de vendas de uma distribuidora de filmes.
Correndo o País com filmes debaixo do braço, trombou, há 22 anos, com aquela que seria sua primeira sala, o Cine São Luiz, em Poços de Caldas (MG), colocado à venda porque o proprietário estava doente. "O nosso pé afundava no tapete. Tinha vidros de cristal puro. Era a coisa mais linda", descreve. A sala tinha 1,4 mil lugares. Hoje, está dividida em duas: uma de 200 lugares e outra de 500:'
O São Luiz é um dos poucos cinemas de rua que restam a Jorge. Das 36 salas que possui, 20 são em shoppings. "As de rua vão fechando. Em Espírito Santo do Pinhal (SP), um virou Lojas Cem e o outro, bingo. Em Capivari (SP), já fui pra fechar, mas o prefeito não deixa. No outro dia, tinha oito pessoas na sala. E os donos dos terrenos sempre querem alugar ou vender para igrejas ou bancos, que pagam melhor:'
Quem também vê o circuito minguar é Flavio Panzenhagen, dono de uma sala em Santo Ângelo (RS). O negócio da família começou em 1951, quando seu avô abriu o Cine Cisne, na cidade do interior gaúcho, que tem 80 mil habitantes. Chegaram a ser quatro salas. Restou uma. A decadência começou nos anos 80, "por causa do videocassete", no dizer de Panzenhagen.
No início dos anos 2000, o mercado até melhorou, mas, nos últimos dois anos, não há título que faça a sala de 650 lugares lotar. E olha que o ingresso, nos fins de semana, custa 4 reais e 50 centavos. Às segundas-feiras, são 3 reais. As razões, portanto, extrapolam o sempre citado alto custo dos ingressos.
"A nossa matéria-prima está cada vez mais longe de nós", afirma Panzenhagen, referindo-se à dificuldade de conseguir cópias dos filmes para serem projetados. "Quando consegui uma cópia de 2 Filhos de Francisco, todo mundo já tinha visto o filme no vídeo. Tinha gente vendendo DVD pirata na porta. Eu me mantenho porque tenho três salas comerciais alugadas aqui no espaço do cinema:”
O problema da falta de cópias é esmiuçado por Paulo Celso Lui, que possui um circuito no interior de São Paulo, na região de Campinas. "Filmes como Vôo United 93 ou A Casa do Lago chegam ao interior 90 dias depois de terem estreado nas cidades grandes, praticamente ao mesmo tempo em que o vídeo", explica. "O cara passa em frente ao cinema e diz: 'Vocês estão passando coisa velha!' E ele tem razão. O problema é que, assim, as pessoas vão perdendo o hábito de ir ao cinema:'
A ligação de Lui com o cinema também remonta à família. O avô abriu a primeira sala, em Indaiatuba, em 1962. Chamava-se Alvorada e tinha 1,1 mil lugares. Perdurou até 1989. Virou um Magazine Luiza. "Com a chegada do Cinemark, em 1997, todos os cinemas foram obrigados a se modernizar."
Eli Jorge aposta, inclusive, que uma cidade de 80 mil habitantes não comporta mais cinema. "Tem de fazer cinema de ponta e, para isso, o investimento é alto. No primeiro dia, é uma alegria, o povo vai todo animado. Mas, depois, não paga nem energia elétrica:' Em seu circuito, a ocupação média é de 40% nos fins de semana e de 10% durante a semana.
Se, de um lado, os exibidores se queixam da falta de bons filmes na hora certa, de outro, os distribuidores vêem algumas salas como negócio inviável. "Colocamos a cópia e, muitas vezes, o faturamento da sala não é suficiente para bancar os nossos custos", atesta Rodrigo Saturnino Braga, diretor da Columbia Pictures. Para evitar o prejuízo, os distribuidores cobram, desses cinemas, uma garantia mínima, que vai de 400 a 700 reais. No gaúcho Cine Cisne, por exemplo, Casseta&Planeta, rendeu 507 reais.
"Acho importante deixar claro que falta cinema nas áreas populares também, e não só nas cidades pequenas", acrescenta Braga. "É a perda desse circuito popular que dificulta o crescimento do cinema no Brasil." A pergunta que fica, depois de constatada a situação das salas nas pequenas cidades, é: há mesmo espaço para a ampliação do circuito? Dificil saber.
Manoel Rangel, diretor da Agência Nacional do Cinema (Ancine), diz que a instituição está elaborando um estudo que mostra o potencial de cada região e cria um índice de déficit de salas. "Com isso, poderemos pensar num incentivo de maneira mais efetiva", afirma. "É preciso, por exemplo, ter uma política de preços diferenciada. Um cinema, no interior, não consegue se manter se o ingresso for de 16 reais. Penso que é possível ter salas a um custo mais baixo. Mas também há lugares em que a sala só vai se manter se tiver uma parceria com o Estado:'
Muitos donos de cinema apostam no digital (que elimina a necessidade de cópias) como uma possível saída para essa situação difícil. Mas quem já começa a trabalhar com esse sistema, duvida. "Só o projetor digital custa 100 mil dólares", diz Valmir Fernandes, presidente do Cinemark, que inaugurou uma sala digital no Shopping Eldorado, em São Paulo, na sexta-feira 8. "Acho difícil que essa seja uma solução para os pequenos:'
Como se nota, as saídas não são simples.
E os novos negócios em curso indicam que o mercado, do jeito como está, tende à concentração, com abertura de mais salas nos lugares onde elas já existem. "Só pedimos que o governo e outros elos do cinema olhem pra gente", finaliza Lui. De fato, não adianta, de um lado, falar de crescimento e, de outro, deixar os pequenos cinemas sumirem do mapa.
- POR ANA PAULA SOUSA


fonte: http://www.cartacapital.com.br

1 Comments:

Blogger Sir Andherson said...

É realmente lamentável a forma como os cinemas de rua estão desaparecendo. Acredito que a maioria de nossos leitores tenham começado a ir ao cinema em uma sala deste tipo e hoje passam pelo mesmo local e encontram uma loja, um mercado e até igrejas.
O incentivo à estes empreendedores é inexistente.
Imaginem só, se acabarem com o Roxy, ou pior, com o Odeon!
E citando ainda os altos preços de ingressos, nos grandes cinemas, faz com que o público procure fazer outros programas, ou diminua a freqüencia. E isso incentiva a todos procurar uma outra alternativa para baratear sua ida ao cinema, representada pelas carteirinhas de estudante. E isso é fato.

O Cinema é cultura, gera empregos diretos e indiretos. Não pode ser deixado de lado. E esperamos que a ANCINE seja um agente de mudaças positivas nesta área que é tanto carente, em todo o país.

segunda-feira, dezembro 11, 2006  

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